Inclusão - Uma Realidade que os números não mostram

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  O ser humano é um ser único com o seu conjunto biológico e seu contexto social. A diversidade humana é bastante rica e, ao mesmo tempo, pode ser complexa, principalmente, quando a característica da diferença que tratamos é uma deficiência. Por mais que evoluamos com tecnologias avançadas o olhar para uma pessoa "diferente” continua existindo. A diversidade humana com todo o seu diferencial é bem discutida no meio educacional nos dias atuais e, segundo Mantoan (2003) “ está sendo cada vez mais desvelada e destacada e é condição imprescindível para se entender como aprendemos e como compreendemos o mundo e a nós mesmos” . No entanto, a maioria das instituições brasileiras não está preparada para trabalhar com as diferenças de uma deficiência. Buscam apoio nas secretarias de educação que devido à falta de estrutura e de pessoal, na maioria das vezes, não conseguem suprir as necessidades de suas unidades escolares que lançam sobre os professores a responsabilidade de arcar com os al...

Violência contra a mulher - Olhos que Penetram a Noite.


Olhos que penetram uma noite e a perduram por anos.

“Estava vindo de uma reunião e já era noite. Eu estava sozinha e andando pela calçada onde nada se movia.  As casas pareciam vazias. Sem vida. A noite estava silenciosa a não ser pelo barulho das folhas que bailavam com o vento. Pode se pensar que em meio a becos sombrios e ruas escuras como aquelas não se encontre nada além de medo, incertezas e escuridão. Mas, quem pensa assim pode estar equivocado. No meio do nada, de todo o breu pode-se esconder algo precioso. Algo que só mentes astutas e maquiavélicas conseguem enxergar em meio a um ambiente assim. Mentes que veem além de seus olhos, que penetram na escuridão como se estivessem entrando num labirinto de olhos fechados sendo guiadas pelo instinto e pela perspicácia de seu ser. Em certo ponto de meu trajeto comecei ter a sensação de estar sendo acompanhada. Olhava para trás e nada, para os lados e também nada. À frente só a iluminação precária dos postes que refletia sua luz fraca no chão molhado pela neblina que descia. Comecei a aumentar meus passos, peguei umas pedras pequenas que encontrei pelo chão e fui para o meio da rua com meu coração acelerado e muito medo. Em certo ponto da viela havia uma rua bem estreita e escura por onde não tinha como eu desviar. Parei. Respirei bem fundo, ajeitei as pedras na mão e segui. Quando estava terminando de passar por aquela rua, fui surpreendida por um vulto de sobretudo e chapéu que me pegou pelo braço e encostou na parede. Seu corpo estava tão quente que saia um calor através do sobretudo misturado a um perfume barato junto com um hálito forte de cigarro. Meu medo misturou-se a uma sensação estranha ao ouvir aquela voz sussurrando: - Você está sempre em meus pensamentos! Não consigo me controlar! Preciso saciar essa vontade que me consome! – ao dizer essas palavras, meu coração acelerou tanto que só me lembro de ver que passava alguém longe, mas depois perdi os sentidos. Quando acordei estava sozinha deitada no chão, com a roupa suja e uma sensação de dor pelo corpo todo. Parecia que a noite tivesse se estendido por mais tempo. Um rapaz que assistiu tudo veio até mim e disse que não me ajudou porque pensou ser “coisa de homem e mulher” e me ajudou a levantar devagar. Mesmo daquele jeito, fui andando lentamente até minha casa. Descansei e logo, mesmo ainda suja atravessei a cidade - sendo observada com olhares de vários tipos menos de ajuda ou de empatia – fui à delegacia contar o que havia acontecido. Ao chegar lá, meus cabelos caiam no balcão, meu pescoço, meus braços e todo o meu corpo doía. Relatei para o escrivão o ocorrido e ele se virou para mim sem sequer me perguntar se eu estava bem e disse que dali a uns dias eu voltaria para retirar a queixa como “toda mulher de malandro faz”. Confesso que me senti um lixo. Nem um exame foi feito, nem nada de providências. Sem falar no amor e empatia das pessoas que me viram. O rapaz que assistiu e não me ajudou. Aquela noite perdurou por meses em minha vida. Vi a necessidade de fazer terapia por conta própria. A terapeuta me levou para fazer vários exames na casa da Mulher – eu não tinha coragem de ir sozinha. Ela foi comigo. Os resultados foram negativos para DSTs. Um alívio pra mim que vivia em uma constante noite. Com o passar do tempo, fui superando e fazendo com que essa noite começasse a clarear. Casei. Mesmo assim, por dentro a sombra daquela noite ainda existia, veio a quase se tornar branca dois anos depois quando recebi uma intimação para comparecer à delegacia e esclarecer os fatos. Como eu já estava casada, meu marido pediu que eu não desse continuidade ao processo e foi o que fiz em respeito a ele e devido à demora, pois dois anos não são dois dias!!! E o que aconteceu naquele dia ninguém mais faz desaparecer da minha mente, e a justiça? No entanto, superei a noite dentro de mim. Percebi que não sou um lixo. Estou aqui vivenciando amanhãs que aprendi a valorizar com a noite sombria dentro de mim.

    'Talvez, se eu fosse afrodescendente, os direitos humanos tivessem feito alguma coisa, mas, como sou     só mais uma mulher branca e pobre, como muitas no anonimato que sofrem e não tem voz, passei         por desapercebida e virei estatística' - diz.

Essa crônica é baseada em uma história real de alguém que se reserva ao anonimato para não ser exposta, mas que representa muitas mulheres brancas que são agredidas, abusadas, violentadas e muito pouco ou nada é feito para ajudá-las!


Somos Marias, Anas, Carlas, Sofias, Cláudias, Bernadetes, Flávias, Lívias, Karens, Luízas, Carolinas, Patrícias, Jéssicas, Martas, Cristinas, Lúcias, Denises, e tantas outras brasileiras sem voz, mas que para a população não passa de mais uma na estatística. Independente de raça, cor, religião o ser Humano precisa ter amor pelo outro e precisa ser olhado da mesma forma. Se cada um fizer a sua parte, podemos mudar o quadro. É um processo lento, mas antes lento do que impossível. Precisamos resgatar os valores humanos.


E você, está fazendo a sua parte?





Comentários

  1. Um relato no qual ninguém fica indiferente. Infelizmente a justiça não faz nada. Por vezes, dentro da própria justiça, também existe o assédio... Obrigada pela partilha do texto!
    Sim, existem muitas "Marias" nesta situação!🌹

    *
    Neste mundo aonde me permito vaguear
    *
    Beijos e uma excelente semana.

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    1. Sim, Cidália! Não tem como ficar indiferente diante de um relato desses, essa mulher sobreviveu para contar sua experiência tanto com a violência física vivida com o agressor , quanto pela psicológica vivenciada na delegacia. Fico pensando quantas vivem isso e são silenciadas??

      Boa semana, minha flor!

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  2. Uma história tão mais inquietante por ser verdadeira. Muito bem contada esta crónica lembra-nos quanta violência existe por aí sobre as mulheres sem que ninguém se importe...
    Uma boa semana com muita saúde.
    Um beijo.

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    1. E Bem verdadeira, Graça. Como muitas por aí que ninguém toma conhecimento.

      Boa semana e fique bem.

      Beijinhos.

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    2. Meus olhos umedeceram por sua causa e quando
      percebi que não eras a protagonista do filme, segui
      triste do mesmo jeito. Meu Deus, como o ser humano
      é malvado com a própria espécie!
      Parabéns pela narrativa. Gente, cuidado com o que
      vocês fazem. Lembrem-se que, “Aquele” que teve coragem
      de dar o seu “filho” para salvar o mundo também
      pode tirar dos homens o que lhe enche os olhos e tira
      sua razão. Já pensou ficar sem mulher, já?!
      Um beijo e parabéns pela escrita.
      (vamos seguir o blog um do outro, vamos?!)

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    3. O ser humano tem uma natureza que pode ser, e tem sido cada vez mais, fria e desprovida de sentimento pelo próximo.

      Obrigada pela sua visita e seu comentário, Silvio!

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  3. Entre homem e mulher ninguém mete a colher.
    Terá sido por isso que ninguém auxiliou a vítima e permitiu uma violação.
    Bjs, boa semana

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    1. Parece que sim, Pedro, mas não era o caso. pois não se tratava de marido e mulher. Mas, foi o que o rapaz pensou, segundo a vítima relatou. No entanto, mesmo assim, ele poderia ter ligado para a polícia anonimamente e dito que havia algo suspeito. Não havia desculpa.

      Beijinhos e boa semana.

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  4. Um excelente texto e faço minhas as palavras da Cidália e da Graça.
    Um abraço e boa semana.

    Andarilhar
    Dedais de Francisco e Idalisa
    O prazer dos livros

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    1. Caro amigo, Francisco, agradeço sua visita e seu comentário.
      Boa semana!!

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  5. Que tema instigante e que os provoca tristeza pois vemos acontecer mais e mais e parece não ter fim. Triste isso! Lindo dia! bjs, tudo de bom,chica

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    1. Verdade, Chica! É muito recorrente!

      Beijinhos e boa semana!

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  6. Verdadeiramente inquietante o teu texto!
    Os monstros existem. E a monstruosidade só pára quando a justiça deixar de ser complacente. Falo em justiça e não em justicialismo.
    Temos todos, que acabar com esta vergonha!!

    Um abraço.

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    1. Existem em todas as esferas.

      Obrigada por vir e comentar.

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  7. Olá, Cléo!

    Um relato impressionante, mas, infelizmente, esses atos continuam a existir por todo o lugar, e tanto faz ser gente de classe alta, qto baixa. A mulher, em parte, tem culpa, pke acaba por retirar a queixa apresentada na delegacia/polícia e continua a viver com homens, maridos ou companheiros, violentos e que as tratam muito mal. Então, querem ser lixo ou têm outras razões para continuar: medo, dependência económica, etc.
    No caso da personagem dessa tua história, ela fez mal por não ter comparecido na polícia mesmo após dois anos do sucedido e estando já casada, mas de novo aceitou a opinião de seu novo marido. Procedeu mal.
    As terapias a que foi submetida ajudaram muito, mas algo fica sempre em sua mente: aquela tenebrosa noite.
    O rapaz bem que poderia, mesmo anonimamente, ter denunciado o caso, mas pensou ser zanga entre marido e mulher, aliás, é o que todo o mundo pensa, mas mesmo que fossem marido e mulher, há que denunciar, porque a mulher é sempre o elo mais fraco.

    Qto à sua questão, posso te responder que já denunciei dois casos de casais que viviam no edifício de 9 andares onde habito e cada um foi para seu lado. Agora divorciados e com novo amor, se sentem felizes, porque há harmonia, entendimento e respeito.

    Beijos e bom domingo.

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    1. Céu, fico feliz por teu relato! Contente por saber que não é conivente com essas situações, eu também já fiz. Inclusive aconselho a meus filhos na condução de suas namoradas, pois nuca se sabe o que pode acontecer. O mundo está difícil de se viver, enquanto a natureza luta para sobreviver em seu esplendor, o homem a todo custo tenta destruí-la com seu modo de vida cada vez mais duvidoso.
      Obrigada por vir, minha flor!

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  8. Uma crónica triste e que nos causa mágoa.
    E ainda mais por ser baseada em factos reais.
    Tenha dias cheios de saúde .
    Beijinhos
    :)
    http://olharemtonsdemaresia.blogspot.com/

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    1. Olá, Piedade! Sim, é verídica lamentavelmente.

      Paz e saúde para ti também!!!

      Beijinhos.

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  9. Triste historia y tremenda realidad. Un texto muy profundo. Beso

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    1. Que prazer recebê-la, Hanna!
      Sim, é um fato triste e real!

      Beijinhos.

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